sábado, 25 de maio de 2013

A Significativa Diferença entre Crer e ter Fé


"Se o espírito humano não está sintonizado com o espírito de Deus, ele não tem fé, embora talvez creia."

O notável professor, filósofo e humanista brasileiro, Huberto Rohden, em um de seus oportunos comentários inseridos no livro “A Mensagem Viva do Cristo”, obra que compreende a tradução feita por ele mesmo dos quatro evangelhos, diretamente do grego do primeiro século, convida-nos a refletir sobre a significativa distinção entre crer e ter fé. Para ele, a não compreensão dessa questão tem deturpado a teologia e trazido enorme prejuízo à mensagem do Cristo ao longo desses 2000 anos. 

Escreve ele: 
“Desde os primeiros séculos do Cristianismo, quando o texto grego do Evangelho foi traduzido para o latim, principiou a funesta identificação de crer com ter fé. A palavra grega para fé é pistis , cujo verbo é pisteuein . 
Infelizmente, o substantivo latino fides , o correspondente a pistis , não tem verbo e assim, os tradutores latinos se viram obrigados a recorrer a um verbo de outro radical para exprimir o grego pisteuein, ter fé. O verbo latino que substituiu o grego pisteuein é credere , que em português deu crer . Nenhuma das cinco línguas neo latinas — português, espanhol, italiano, francês, rumeno possui verbo derivado do substantivo fides ; fé; todas essas línguas são obrigadas a recorrer a um verbo derivado de credere . Ora, a palavra pistis ou fides significa originariamente harmonia, sintonia, consonância. Ter fé é estabelecer ou ter sintonia, harmonia entre o espírito humano e o espírito divino.”

Se o espírito humano não está sintonizado com o espírito de Deus, ele não tem fé, embora talvez creia. Para o ilustre filósofo aí está um dos maiores problemas que em muito vem prejudicando a teologia e, para explicar a diferença de significado entre uma coisa e outra, estabelece Rohden o seguinte paralelo ilustrativo: 
“Um receptor de rádio só recebe a onde eletrônica emitida pela estação emissora, quando o receptor está sintonizado ou afinado perfeitamente com a frequência da emissora. Se a emissora, por exemplo, emite uma onda de frequência 100, o meu receptor só reage a essa onda e recebe-a quando está sintonizado com a frequência 100. Só neste caso, o meu receptor tem fé , fidelidade, harmonia; fideliza com a emissora”. 

Dentro desse contexto, “se o espírito humano não está sintonizado com o espírito de Deus, ele não tem fé, embora talvez creia. Esse homem pode, em teoria, aceitar que Deus existe e, apesar disso, não ter fé. Ter fé é estar em sintonia com Deus, tanto pela consciência como também pela vivência, ao passo que um homem sem sintonia com Deus pela consciência e pela vivência, pela mística e pela ética, pode crer vagamente em Deus. Crer é um ato de boa vontade; ter fé é uma atitude de consciência e de vivência”, argumenta o professor Rohden. 

Salvação não é outra coisa senão a harmonia da consciência e da vivência com Deus Para ele, a conhecida frase “quem crer será salvo, quem não crer será condenado”, é absurda e blasfema no sentido em que ela é geralmente usada pelos teólogos. No entanto, “se lhe dermos o sentido verdadeiro ‘quem tiver fé será salvo' ela está certa, porque salvação não é outra coisa senão a harmonia da consciência e da vivência com Deus”. 
Em sua opinião de sincero buscador, erudito e filósofo espiritualista “a substituição de ter fé por crer há quase 2000 anos, está desgraçando a teologia, deturpando profundamente a mensagem do Cristo”. 
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Adolfo Guimarães
Obra consultada: 
"A Mensagem Viva do Cristo", Huberto Rohden, Alvorada, 4.ª edição

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