quarta-feira, 11 de maio de 2011

O DILEMA DA DISCIPLINA

É bastante comum, nos dias de hoje, ouvirmos reclamações de pais e professores, em torno do comportamento indisciplinado de crianças e jovens. Palavrões, brigas, pichachões, desrespeito aos mais velhos, desleixo com a aparência, iniciação sexual precoce, gravidez na adolescência, etc., fazem parte do rol de atitudes mencionadas para caracterizar esse comportamento indisciplinado.


Despreparo dos Pais.
Quando bem dotados financeiramente, matriculam os filhos nas melhores escolas, oportunizam-lhes viagens de estudos e entretenimento, oferecem-lhes cursos de informática e idiomas, alimentação apurada, cuidando com extremo desvelo do corpo e investindo somente na formação intelectual deles.

A formação moral
Quando lembrada, é relegada para alguma religião ou transferida para a escola, pois estes mesmos pais estão muito ocupados, com outros afazeres ou envolvidos com atividades que consideram relevantes.
Nas famílias mais pobres de recursos materiais, o desenvolvimento da criança já se vê comprometido em razão da carência alimentar e da falta de tempo dos pais para orientá-los, pois saem muito cedo para trabalhar e retornam muito tarde. Existindo então outros complicadores.
Às vezes, a criança é filha de pais separados, que por razões diversas nem sempre conseguem atender convenientemente as suas carências e necessidades.

A televisão
Tornou-se de um tempo para cá a companheira e a educadora de muitas das nossas crianças e jovens, e, infelizmente, uma companhia altamente questionável.

Despreparo dos professores
É preciso que se diga ainda que os professores, na grande maioria, não foram preparados para lidar com crianças que apresentam problemas de comportamento e nem com aquelas portadoras de necessidades especiais. Quando conseguem um mínimo de conhecimento teórico, é porque fazem algum curso adicional ou a larga experiência dos anos lhes fez acumular conhecimentos suficientes sobre o assunto.
Ao despreparo dos pais junta-se o despreparo dos professores.

Espíritos reencarnados
Considerando essa variedade de fatores, que até certo ponto explicam os problemas apresentados pelos educandos, não podemos esquecer que eles são espíritos reencarnados, trazendo tendências e aptidões das vidas passadas. E que os mesmos possuem afetos e desafetos no mundo espiritual, influenciando direta ou indiretamente o comportamento deles.

Com tudo isso, como estabelecer uma disciplina que prepare, oriente e colabore na formação de homens de bem?
Didaticamente podemos pensar em três níveis de disciplina:
  1. Preventiva
  2. Punitiva
  3. Reparadora
A disciplina preventiva é aquela que é trabalhada desde a gestação, perpassando todas as fases do desenvolvimento biopsicossocial da criança.
Paulo Freire salienta que a disciplina externa é necessária para estruturar a interna, e que a criança entregue a si mesma dificilmente se disciplina. A presença e o exercício da autoridade paterna e materna, é indispensável na construção da sua autonomia.

Parafraseando o educador Rubem Alves, afirmamos que é essencial libertar a criança das disciplinas desnecessárias, a fim de que ela consiga lidar e até aceitar aquelas que são inevitáveis no caminho de qualquer pessoa adulta.
Como é importante a presença de limites, de regras na fase infantil!

A importância da disciplina
E disciplina não é apenas um conjunto de normas que estipulam deveres a serem cumpridos. A Natureza possui uma disciplina sem a qual os mares invadiriam as regiões continentais, os continentes gelados se derreteriam, as cadeias alimentares entrariam em desequilíbrio, os planetas colidiriam uns com os outros. O amor estabelece a disciplina do bem querer, do perdoar incessantemente, do fazer o bem a quem nos faz o mal e assim por diante.

Não podemos e nem devemos associar disciplina a surras e agressões, pois esse tipo de postura já é violência e não disciplina

Joanna de Ângelis fala-nos de três tipos de indivíduos adultos, que resultam de uma educação bem ou mal orientada.

OS TIPOS
  •  Os insatisfeitos: são aqueles que foram vítimas de pais instáveis emocionalmente, despreparados para orientarem seus filhos para a vida. Pais violentos ou indiferentes.
  • Os dependentes: são aqueles que foram mimados, tiveram todas as suas vontades e caprichos satisfeitos, viveram numa redoma e quando em contato com o mundo, precisando cortar o cordão umbilical e decidir, optar, entram em crise ou sempre recorrem a quem possa decidir por eles.
  • Os realizados: são pessoas que vivem instantes de dependência e de insatisfação, mas conseguem administrar bem os seus conflitos. Normalmente conviveram com regras e tiveram afeto durante a infância, e graças a isso, desenvolveram uma capacidade de decidir com autonomia, correndo os riscos necessários e assumindo as consequências dos seus atos.
A disciplina punitiva é aquela aplicada nos presídios, nos lares onde os pais corrigem com violência seus filhos, nos países onde o crime é punido com outro crime (pena de morte), e que, inevitavelmente, não promove, não remove as causas da indisciplina.

A esse respeito Pedro de Camargo escreveu:
"Para bem agirmos em prol do saneamento moral, precisamos partir deste princípio: o crime não é o criminoso, o vício não é o viciado, o pecado não é o pecador(...) o doente não é a doença. Assim como se combatem as enfermidades e não os enfermos, assim também se devem combater o crime, o vício e o pecado, e não o criminoso, o viciado e o pecador."

Castigos
Theobaldo Miranda Santos afirma que os castigos ministrados com raiva, até acentuam a revolta da criança. É necessário que ela perceba na correção, de que é objeto, o propósito do seu aperfeiçoamento.Não se pode perder de vista o despreparo dos pais na condução da prole.

A disciplina reparadora, é a única capaz de ir nas causas da indisciplina, que se localizam no espírito imortal e que, segundo Ney Lobo, citando Allan Kardec, residem no instinto de conservação exagerado e no desconhecimento do passado e do futuro do espírito. Só ela pode minimizar a crença na superioridade individual, o orgulho e o egoísmo, que conduzimos em nosso cerne.

Exemplificando: é preciso que a criança seja levada a corrigir o que errou, consertar o que quebrou, repor o que retirou, desculpar-se com quem ofendeu, fazendo sempre uma ação contrária e correta àquela que foi considerada uma indisciplina. Conscientizando-se de que errou.
É claro que isso não se consegue sempre no exato momento em que ela é flagrada em erro.
É preciso que os educadores, de um modo geral, tenham o tato necessário para aguardar a hora certa de solicitar a correção. No calor das emoções exaltadas é muito difícil que a criança se predisponha a essa reparação. E não raro, quando se exige isso logo de imediato, comete-se um outro erro, o de humilhá-la, obrigando-a a uma correção forçada e exterior, sem que ela se convença do seu equívoco.

Escreve o filósofo Ney Lobo:
"O grau de responsabilidade disciplinar do educando deve ser diretamente proporcional à gravidade da falta, ao grau de liberdade em cometê-la ou não e à sua idade, não somente biológica ou mental, mas relativa ao nível espiritual. Esta idade espiritual se apresenta através dos componentes: inteligência e moralidade (variáveis de um espírito para outro)."

É com a disciplina reparadora que a criança conseguirá ser um adulto realizado, nas palavras de Joanna de Ângelis, libertando-se de sentimentos de culpa, da censura social, estruturando sua disciplina interna e utilizando seu livre-arbítrio sempre para o bem.

Diz-nos também Allan Kardec, no livro O Céu e o Inferno:
"Arrependimento, expiação e reparação constituem, portanto, as condições necessárias para apagar os traços de uma falta e suas consequências. O arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo, pela esperança, o caminho da reabilitação; só a reparação contudo pode anular o efeito destruindo-lhe a causa."

Só nos resta investir cada vez mais na Educação do Espírito, se quisermos fazer da Terra um mundo feliz, governado por homens inteligentes e bons, regidos pela disciplina do Amor.

Cezar Braga Said
Retirado da Revista Estudos Espíritas
 Agosto de 1999
Edições Léon Denis

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