quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

INFÂNCIA VIOLÊNTADA

Como acabar com esse verdadeiro crime hediondo?

Derrubada de tabus
É justamente nesta questão do apoio às crianças molestadas que entra um componente perigoso, que acaba se tornando o maior cúmplice dos constantes abusos sexuais na infância: o tabu. Por mais que a sociedade tenha evoluído intelectualmente, o preconceito e a vergonha de discutir coisas relacionadas ao sexo e à violência sexual continuam fortes e muitas pessoas preferem apenas empurrar o problema para debaixo do tapete.
Vejam o caso do médico hebiatra, por exemplo. A história veio à tona apenas porque uma pessoa encontrou as fitas de vídeo jogadas no meio do entulho e, ao ver as imagens, entregou o material a uma emissora de tv, que fez a denúncia. Entretanto, durante todo o tempo em que o médico abusou sexualmente de seus pacientes, nenhum deles ou seus familiares teve coragem de contar o que acontecia. 

A Motivação
Mas o que leva uma pessoa, muitas vezes cordata e acima de qualquer suspeita, querer e praticar atos libidinosos e abusos sexuais com crianças e adolescentes?
Alguns especialistas afirmam que a pedofilia é uma doença, outros a colocam apenas como uma perversão sexual, da mesma maneira que a tendência ao sadomasoquismo. Assim, o agressor abusa sexualmente de uma criança como forma de mostrar superioridade,
já que a vítima não teria meios de se sobrepor a alguém maior e mais velho.
A questão 365 de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, vem a calhar para explicar casos semelhantes ao do médico paulista:

“Por que homens muito inteligentes, que evidenciam em si um espírito superior, algumas vezes, ao mesmo tempo, são profundamente viciados?
É que o espírito encarnado não é tão puro e o homem cede à influência de outros espíritos piores. O espírito progride através de uma insensível caminhada ascendente, mas o progresso não se realiza simultaneamente em todos os sentidos. Em uma etapa, ele pode avançar em ciência e, em outra, em moralidade”.

Pode-se dizer, então, que pessoas que praticam crimes sexuais contra crianças e adolescentes esqueceram seu lado moral, ficando entregues aos vícios e, assim, com campo aberto para influenciações maléficas de espíritos desequilibrados, que aproveitam para satisfazer seus desejos e criar um ciclo vicioso que só tende a aumentar.

A banalização do sexo
Mas é importante ressaltar que a sociedade também tem sua parcela de culpa na influenciação dos crimes sexuais. A constante banalização da sexualidade em programas da tevê aberta, em horários dos mais variados, e o mau exemplo que nossas crianças recebem, querendo imitar os ídolos televisivos, fomentam esse desejo reprimido de busca desequilibrada de prazer.
No entanto, o que mais preocupa nessa questão da pedofilia são justamente as sequelas que ficam para crianças e adolescentes molestados. Afinal de contas, esse é um período em que a vítima ainda está apreendendo tudo que acontece ao seu redor, está sensível a todo tipo de informação que chega até ela. Como diz a resposta à questão 383 de O Livro dos Espíritos, sobre a importância da infância, “o espírito, encarnando para se aperfeiçoar, é mais acessível, durante esse período, às impressões que recebe e que podem ajudar o seu adiantamento, para o qual devem contribuir aqueles que estão encarregados da sua educação”.

E as consequências desse abalo psicológico são várias, podendo gerar casos de repulsa ao sexo quando adulto, medo e raiva de outras pessoas, a dependência de álcool e drogas e, muitas vezes, a criação de um ciclo vicioso. Desta forma, a criança, quando se torna adulta, passa a também molestar outros pequenos, até como forma de se sentir vingada pelo que os pais ou outros adultos fizeram com ela. E aí caímos naquilo que falei anteriormente, que a pedofilia se torna uma perversão, a pessoa quer se sentir superior e resgatar sua auto-estima transferindo suas frustrações e traumas para outros seres indefesos.

DE QUEM É A RESPONSABILIDADE?
Por Victor Rebelo
Até hoje, são poucas as pessoas que percebem com profundidade a questão da perversão sexual, como a pedofilia, por exemplo. É muito fácil taxarmos o pervertido simplesmente como criminoso e que, como tal, merece punição, mas não é bem assim.
Um criminoso é, antes de tudo, um doente. Se ele merece ficar recluso em uma penitenciária, por outro lado, precisa de tratamento psicológico, às vezes psiquiátrico e sempre espiritual. Necessita também contar com a garantia de que, após cumprir sua pena, terá condições de se reintegrar à sociedade e, em casos de extremo desequilíbrio, quando não é possível sua volta, ser cuidado com responsabilidade e amor, uma vez que, não o tratando nesta encarnação, ele terá de ser amparado no plano espiritual ou em futuras encarnações.
Portanto, nós, espíritas, sabemos que a sociedade jamais fugirá do que é sua responsabilidade, de seu “carma coletivo”.
Precisamos perceber urgentemente que, se existe o crime, é porque nós permitimos.
Consentimos que programas de auditório, filmes e danças que incentivam as pessoas à sensualidade, ultrapassando os limites do natural e chegando a vibrações de puro “animalismo”, sejam exibidos diariamente na televisão.
Quantos pais, ao verem seus pequenos pupilos imitarem certas danças de forte influência erótica, aplaudem o fato, esquecendo-se, com isso, que estão contribuindo com o desequilíbrio social.
Costumam dizer: “Quando minha filha de seis anos dança o ‘tchan’, ela é tão meiga, tão inocente”. Pode ser para eles, mas é um prato cheio para um pedófilo. Isso mostra o quanto incentivamos os desequilíbrios sociais sem perceber.

Como resolver essa situação?
Acima de tudo, iniciar um combate à prática dos crimes sexuais,
inclusive com mudanças na legislação, acabar com o tabu que cerca o tema e denunciar aqueles que cometem esse tipo de ato, aniquilar o silêncio que nos faz consentir, como diz o ditado. Mas não podemos abrir mão da conscientização da sociedade, alertar sobre os perigos que o abuso sexual de crianças e adolescentes oferece para nossas futuras gerações.

A postura do espírita
Nesse ponto, entendo que cabe ao espírita levar a palavra do Espiritismo nesse trabalho de conscientização.
Aproximar as pessoas dos ensinamentos do Cristo e mostrar a elas a importância do cuidado com os seres que ainda estão em formação são coisas que devemos fazer diariamente. Devemos deixar claro que temos de manter nossos princípios morais sempre em alerta, como forma de nos proteger de influenciações negativas de espíritos desequilibrados, combatendo todo tipo de distorção.
Penso ainda que a doutrina espírita é o melhor remédio para ajudar na recuperação de crianças vítimas de abusos sexuais, por mostrar a elas que a vingança e o ódio tornarão suas jornadas evolutivas ainda
mais complicadas, mostrar que, de algo tão ruim, pode surgir uma ótima fonte de conhecimento e coragem, mostrar que o perdão é fundamental para nos aproximar do Criador. Por fim, cabe-nos perdoar também o agressor, afinal de contas, ele é um espírito que precisa de conhecimento, de esclarecimento. Simplesmente condená-lo e isolá-lo é um crime tão hediondo quanto o abuso, estaremos criando ainda mais rancor e violência para o futuro. Portanto, não ofertemos raiva e preconceito, mas doemos amor!


Revista Rcespiritismo
Por Rogério Magalhães

Um comentário:

Thalita disse...

Parabéns pelo texto e pela abordagem ao assunto. Estamos entrando numa era onde uma grande movimentação pelas questões psicológicas está se fazendo presente. A saúde mental não pode ser negligenciada mais, como era antigamente. Abuso e violência, além das consequencias citadas aqui, também criam no violentado (seja por familiar, seja por estranho) um acervo de emoções demasiadamente fortes para que ele possa lidar, e que escapam ao seu entendimento, vazando para outras situações em sua vida. O que pode, inclusive, fazer com que o trauma não lhe perturbe conscientemente. Imagine que temos que lidar com frustrações desde a infância. O constrangimento de levar uma bronca leve na escola e o constrangimento de um assédio provocam uma frustração. Uma num grau leve, a outra, num grau absurdamente dilatado. Já pensou que a cada situação pequena a frustração manifestada seja aquela última mais forte, sem que a pessoa possa escolher? E daí, que a vida da pessoa se torna conturbada em outros aspectos. Nos relaciomentos que vem acompanhados de pequenas frustrações, sem poder regular o mecanismo (porque a pessoa tem um acervo diferente das pessoas "normais") ela reage desproporcionalmente. A vítima, dependendo do seu meio ambiente e da sensibilidade de terceiros, passa a sofrer também por não ser compreendida. Trata-se de um mecanismo automático, como se o trauma lhe criasse um default. Interessante, triste, mas verdade. A vítima se perpetua vítima, e um desgraçado desencadeia uma consequencia bastante difícil de ser compreendida por todos. Sofre-se muitas vezes pelo trauma. Gostaria que alguém validasse o assunto. A família precisa estar mais atenta. É preciso muito amor e dedicação, muito carinho, pois a pessoa sente-se vítima sempre, graças às diversas sensações (situações que podem indicar a mínima rejeição de seus direitos humanos, falta de afeto, falta de segurança, falta de sensibilidade, humor sórdido, disputa de poder - pais, filhos, namorados) e acessa um sentimento desproporcional quando se encontra em desamparo nas situações normais da vida cotidiana. É registro, é acervo que revive, porque está ali como um botão acionado pelo mundo que a cerca. Agradecei vós que tem como default as experiências mais brandas, porque podem lidar com mais frieza aos dissabores da vida.